Portugal e outras touradas
aperoladanet@gmail.com
21 março 2012
06 fevereiro 2012
Atenção!
02 julho 2011
Encerrado
ALENTEJO REVISITADO
a meu avô Francisco
I
Do rosto que olha o Alentejo é o corpo
mas não somente o corpo a árvore
figueira junto ao mar um pássaro
perto do coração
Trigo que escutamos e que vemos
antes de ser o pão
A mão que desvenda
o sítio exacto da alma
vegetal animal e mineral
em todos os caminhos
Para sempre
um país sob a luz menino imemorial
II
Durante tanto tempo foste
o companheiro das coisas vivas
Terás de encher agora os teus bosques ardentes
de neblina e silencio e animais sem condição
E deverás olhar as coisas mortas
como se todas as manhãs elas partissem
Tudo o que tens e que tiveste outrora
a paz que em vão buscaste tantos anos
nesse lugar fecundo ficará
Quanto oceano quanta sede quanta voz
na escuridão das searas que amanhecem
Alentejo um pão cortado
na sombra dos candeeiros dentro das casas desertas.
in Os Olhares Perdidos
26 junho 2011
Divulgação
19 junho 2011
14 junho 2011
11 junho 2011
Etiquetas
06 junho 2011
Meus caros amigos:
"Homem do leme"
05 junho 2011
O que diz Nicolau Saião...
Pelo menos...
Sócrates e a vergonha de um país
No próximo sábado haverá uma manifestação justa...
Malandro que é malandro...
SINDICATO DE LADRÕES
1. Ficha criminal
Antonio Palocci emergiu como figura política nacional no rastro de um assassinato: tornou-se o coordenador da campanha de Lula de 2002 em função da morte a tiros do primeiro candidato ao posto, o prefeito de Campinas, Celso Daniel. Tratou-se, além disso, de um assassinato político, de uma “queima de arquivos” ligada a um esquema de propinas, superfaturamento e “caixa 2”. Antonio Palocci, em suma, tornou-se uma figura política nacional em função de um esquema de propinas e de um assassinato político envolvendo diretamente o PT – e a própria campanha presidencial de Lula, na figura de Celso Daniel.
Paralela e independentemente, Antonio Palocci teve seu próprio nome envolvido em outro esquema semelhante, o da “máfia do lixo” da prefeitura da Ribeirão Preto, da qual fora titular. Apesar de tudo (ou por tudo), foi em seguida alçado a ministro da Fazendo de Lula, apenas para ser derrubado pelo escândalo da quebra criminosa do sigilo bancário da um caseiro. Motivo (da quebra criminosa do sigilo): o pobre caseiro testemunhara que o ministro era habitué de certo endereço mal afamado de Brasília, conhecido como “casa do lobby”. Antonio Palocci afinal afundaria em um mais do que merecido – apesar de tardio – ostracismo.
Pois toda sua história política, direta ou indiretamente, está assim, de alguma forma, ligada a crimes, que vão do “caixa 2” ao superfaturamento, de esquemas de propinas ao assassinato político, passando pela quebra criminosa de sigilos bancários (a Caixa Econômica Federal há poucos dias confirmou que a quebra do sigilo do caseiro de fato se originou no gabinete do então ministro da Fazenda Antonio Palocci, o que passou despercebido em meio ao ruído do mais novo escândalo político-financeiro envolvendo seu nome). Que tal personagem tenha retornado à política nacional mais uma vez, e mais uma vez pelas mãos amorais de Lula, para ser o coordenador da campanha e depois ministro-chefe da Casa Civil de Dilma Rousseff, entre outras coisas desfaz a máscara da grande “diferença” entre Dilma e Lula, entre criatura e criador, revelando a mesma feia face da promiscuidade com a bandalheira e a bandidagem políticas. A única diferença é mesmo de estilo (da maquiagem política).
Dilma ou não é santa ou é autista. Não há terceira via possível.
Face à desfaçatez faceira de Antonio Palocci, que pretende agora, ao mesmo tempo, poder enriquecer de modo muito mais do que suspeito e manter o sorriso “cordial” e o poder federal, o que importa é aproveitar as novas velhas circunstâncias para tentar lançar alguma luz sobre a nefasta e nefanda força política que tomou conta do país nos últimos anos, o lulo-petismo, cuja síndica atual se chama Dilma Rousseff, e cujos capangas de ocasião atendem pelo nome grupal de PMDB.
2. Análise do DNA
Nesse quadro histórico geral de crimes factuais, é consistente a recorrência do verdadeiro crime ideológico de atacar a liberdade de imprensa, ainda que apenas verbalmente. Foi portanto o que fez nesta semana, no contexto do “caso Palocci 2.0”, o ministro Padilha, ao afirmar que o maior partido de oposição no Brasil é a “grande imprensa”, repetindo assim a letra e o espírito do chefe, Lula da Silva. A razão é conhecida: “gente de esquerda” considera-se certa a priori, nos dois sentidos, no de ter razão e no de ter certezas. Portanto, quando a imprensa discorda da “esquerda”, está errada, e no limite é, em si, um erro. Daí a esquerda, sem aspas, a que antigamente pretendia trocar o capitalismo pela ditadura do proletariado, ter sempre desprezado a imprensa livre, pois tal liberdade era apenas a “liberdade burguesa”. Daí a “grande imprensa” do lulo-petismo não passar de uma atualização pouco imaginativa da velha “imprensa burguesa” da esquerda de antanho. Cabe, todavia, a pergunta: se a “grande imprensa” não tem quaisquer méritos próprios, não passando de um “partido de oposição” (ao lulo-petismo) mal disfarçado, deveria o Brasil trocá-la por uma imprensa nanica, ao estilo de uma pequena república de banana (em vez de uma à altura de uma grande república de bananas, como o Brasil)? Ou, então, ao velho estilo estalinista, por uma imprensa apequenada (pelo medo, pelas vendas e pela venda)?
O PT nasceu ligado aos sindicatos dos trabalhadores para logo se tornar um “sindicato de ladrões”. “Caso Celso Daniel”, “máfia do lixo” de Ribeirão Preto, mensalão e mensaleiros, , “casa do lobby” de Brasília, quebra de sigilos de caseiros, “aloprados” e dossiês, Erenices e Delúbios, caixas 2, 3, 4, empresários “amigos do Lula”, empresários “clientes” de Palocci, a lista é interminável, e demonstra, para quem não tem vocação para a cegueira voluntária, que cada caso isolado não é um caso isolado, mas mais uma manifestação de um mesmo e único fenômeno. Resta acrescentar que Lula é, inquestionavelmente, o grande líder de tais sindicalistas.
3. O principal suspeito
Fundindo o “criminalismo” atávico da política brasileira ao estalinismo congênito da “esquerda”, o lulo-petismo pode afinal ser descrito como um monstro faminto de duas cabeças perniciosas, que veio para devorar devagar a raquítica e anêmica democracia brasileira mal restaurada a partir de 1985.
04 junho 2011
O meu comunicado à Nação (também tenho direito, ou não?!)
Em 2004, disse a amigos meus, militantes do Partido Socialista, que a eventual eleição de José Sócrates para secretário-geral do partido - uma criatura que procurava disfarçar a superficialidade de conhecimentos, a indigência cultural, a falta de estofo humano e a debilidade da inteligência com a agressividade que os portugueses, por ferrete da “estabilidade” salazarista, confundem, frequentemente, com competência - seria algo de muito mau, não só para o PS como, enquanto previsível futuro primeiro-ministro, para o país.
Dois anos decorridos após as eleições que o levaram à chefia do governo, porém, o chico-esperto, embriagado pelo poder, firmando-se em técnicas propagandísticas e manobras de governação que, quem aprofundou um pouco os seus conhecimentos de História, facilmente relaciona com o que se passou em Itália, Alemanha e Portugal durante a terceira e quarta décadas do século XX, elevara-se a si mesmo ao estatuto de clone de caudilho americano, transplantado para a UE. Portugal afundou-se no período mais tenebroso e obscurantista desde o 25 de Abril.
Da parte dos militantes socialistas, em vez do pedido urgente de demissão de Sócrates e sua substituição, vital para o país e para o próprio partido, nem sequer se ouvia um “Porque não te calas…?!”; ao invés, o seu comportamento foi o de um entrincheiramento histérico de “perseguidos bons” com uma agressividade igual à do seu “querido líder”. Até hoje. Veja-se, por exemplo, no que deu o blogue O Jumento, de lúcido crítico de Cavaco Silva a estrebuchante defensor de Sócrates com argumentos dignos da “velha senhora”, e que, dias atrás, me censurou um comentário denunciador de um desses “argumentos”.
Foi, portanto, como forma de defesa pessoal que, em Maio de 2007, surgiu este blogue. Da necessidade de denunciar e de me opor ao que me envenenava e, a meu ver, envenenava o resto do país, destruindo-o - destruindo-nos - bem como de ir preservando a lembrança do mais fundo e melhor da memória colectiva; além de umas faenas com as outras "touradas" que por este mundo têm lugar. No decorrer destes quatro anos, não foi aumentando apenas o número daqueles que vêm até aqui, aumentei também o círculo de amigos. Nunca tanta gente visitou o Portugal e outras touradas como ontem mesmo. Mau-grado a falta de tempo que tenho para tratar alguns temas com a profundidade e o pormenor que eles requereriam.
Chegámos à véspera de eleições que podem ser decisivas. E julgo que, se Sócrates voltar a vencê-las (coisa de que duvido), será a altura de me dedicar a coisas mais genuinamente revolucionárias, isto é, a aprofundar temas que considero cruciais e, para mim, mais gratificantes, já que o povo português estará, de facto, verdadeiramente doente pelo embrutecimento. Se ele perder, passado este período tenebroso, haverá que aguardar pelo resultado das acções dos novos poderes - e, enquanto não se perspectiva com clareza o que nos espera, haverá que… fazer exactamente o mesmo.
O Portugal e outras touradas perdeu, por isso, razão de existir a partir da próxima segunda-feira, qualquer que seja o resultado eleitoral. O que não significa que eu desapareça da “blogosfera”. Não só continuarei a fazer comentários em blogues de outrem como etiquetarei, aos poucos, os quase dois mil posts que editei, para que quem chegou mais tarde possa consultar alguns textos de maior fôlego que escrevi nos primeiros dois anos. Até segunda, contudo, ainda vou andar por aqui (onde é que eu já ouvi isto...?).
Obrigado a todos.
Bastonadas - 3
Calhei a sintonizar a TVI - salvo erro, anteontem - mesmo nos últimos minutos do programa da manhã, a tempo ainda, porém, de assistir a mais uma das habituais inflamações oratórias do sr. Bastonário da Ordem dos Advogados. O inchaço da indignação que, desta vez, o afligia e que, como é nele habitual, o fazia erguer a voz e o indicador direito com que o Criador o dotou para melhor procurar fazer entender ao mundo o que é a Justiça Verdadeira, tinha origem no caso da prisão de uma das adolescentes que, em exemplar comunhão de esforços com outra, espancou violentamente uma terceira a rogo de um adolescente de admirável carácter, o qual - eivado dos mais altos valores civilizacionais, ao sentir-se ultrajado nas veras profundezas superiores do seu ser pelas expressões por esta última empregues para classificar o comportamento socioprofissional daquela que o dera à luz e impedido pelos sagrados princípios morais das relações entre os sexos de a desafiar para um duelo condizente com uma postura cavalheiresca - lho solicitara encarecidamente, reservando-se o papel de cronista de um acto cuja notícia e memória se lhe afigurou de grande proveito para a Humanidade.
Ironizei. Não o considerava assim o sr. dr. Marinho Pinto; tão estreita não era a sua visão nem enevoado o seu discernimento. Considerava mesmo o espancamento como um crime, embora discordasse veementemente da pena aplicada à adolescente mais velha. Era esse, a seu ver, o busílis, a falha, quiçá um outro crime cometido, por seu turno, pela Justiça portuguesa. Porque, ao enviá-la para a prisão - e entumescia-se-lhe a jugular ao frisá-lo -, se estava a enviar uma pobre rapariga para os braços da mentalidade criminosa irrecuperável; porque ela era apenas a vítima da procura de uma punição que desse à opinião pública a ideia de que os tribunais velavam pelo cidadão; porque os verdadeiros e grandes criminosos, os poderosos deste país, continuariam impunes se o caso se tivesse passado com algum deles, como sucede, aliás, em inúmeras ocasiões em bares e clubes nocturnos. A pena é desproporcionada, a justiça portuguesa serve apenas para condenar os pobres; liberte-se a agressora, clamava ele.
Bem dizia o psicólogo de serviço do programa que as coisas não eram bem assim, que não se verifica um tão estreito determinismo de estímulo-resposta do indivíduo ao meio que permitisse ao dr. Marinho Pinto afirmar que a prisão seria, para ela, um factor conducente a um futuro desvio comportamental, que os casos inversos também são frequentes. Bem lhe chegaram aos ouvidos os aplausos do público, quando a entrevistadora lhe perguntou se pensaria da mesma maneira, caso a agredida tivesse sido uma sua filha. Moita! O sr. advogado Bastonário nunca argumentou directa nem fundamentadamente nas respostas que deu.
E terminou o programa.
Não estava em condições de chegar à fala com o dr. Marinho Pinto. Não sou, além disso, ninguém ao pé de quem chegou à posição que ele alcançou. Nem consigo igualar a impetuosidade e o volume da sua oratória. Não me permito, sobretudo, duvidar da sua honestidade, das suas convicções ou do alcance das suas intenções. Mas gostaria de lhe haver posto à consideração aquilo que julgo ter escapado do que se encontrava subjacente ao que disse a entrevistadora e aos aplausos das pessoas que assistiam à troca de argumentos, e que talvez lhe tivesse poupado uma das várias ocasiões em que aparentou a proximidade da apoplexia.
Eu até concordo em que a prisão não é a forma mais racional e eficaz de resolver os problemas a que foi destinada; e em que este caso serviu exactamente para os fins que apontou, com a clara cumplicidade vampiresca da comunicação social; e em que os poderosos se escapam com infinitamente maior facilidade à justiça do que a arraia-miúda. Contudo, aquilo que o mais elementar bom senso popular lhe dirá quanto ao assunto é que os quer a todos na prisão, os criminosos ricos como os criminosos pobres; e que o facto de não ainda não ter sido punido um criminoso rico não deve nem pode ter como consequência deixar entretanto impune um criminoso pobre - até porque este faz parte da reserva de criminosos contratados pelos ricos ou poderosos para levarem a cabo os seus crimes. É que o povo, as pessoas comuns, pobres ou ricas, não querem paternalismo, nem o aceitam da parte de quem o ostenta ou dele se serve para se evidenciar: querem justiça.
E avisá-lo-ia ainda de que, levados pelos maus raciocínios em que a humana fraqueza a tantos e tantas vezes incorre, muitos começaram como ele, para depois virem a sentir-se obrigados a formar movimentos de opinião, movimentos cívicos, partidos, eu sei lá! Ora nenhum português estaria, certamente, disposto a desperdiçar, na política ou em qualquer futuro cargo governamental, um tão brilhante intelectual e causídico.
03 junho 2011
O estranho caso da bactéria ariana
"A sensação"
"Leio, em diversos órgãos de informação nacionais e internacionais, esta notícia que fez manchetes perfeitamente compreensíveis: nos Estados Unidos, o indivíduo que durante 20 anos teve o controle, após sequestro, de uma rapariga na altura com onze anos e de quem se serviu torpemente com a cumplicidade da mulher com quem estava casado, dando origem a duas filhas, foi condenado a 432 anos de prisão.
O indivíduo, um desses pregadores muito usuais nos EUA (um monomaníaco evidente) foi descoberto e finalmente preso - e depois julgado - porque a rapariga em certo dia conseguiu fugir e se refugiou numa esquadra, apresentando queixa nessa altura.
A sensação que me acomete, é: se fosse em Portugal...! Se fosse em Portugal, digo em resposta simbólica e fazendo apelo a uma interior frustração, indignação e desânimo -reais e apoiados em muitos casos mediáticos - posso suspeitar que o predador seria eventualmente objecto de desculpas as mais diversas.
Se, é claro, na esquadra tivessem podido ligar meia à denúncia...
E isto que digo é, na verdade, terrível, pois sinto e sei que esta desconfiança, muito justificada por inúmeros casos de desleixo e de inconformidade, é partilhada pela generalidade dos cidadãos.
É imprescindível que a Justiça em Portugal seja limpa de escórias.
É preciso, dessa forma, devolver a esperança aos cidadãos, finalmente situados num existir de Direito inegociável e cuja ausência os tem ferido irregularmente. E sobre a qual têm tripudiado mediante a força de que se apoderaram de forma capciosa.
E isso só se consegue se não deixarmos que as desculpas incomportáveis dos sectores corporativos (e dos que lhes servem de anteparo) que capturaram a sociedade de Direito, transformando-a numa herdade de que são em parte "manajeiros", continuem a tergiversar.
Num texto escrito e divulgado em diversos órgãos e países, que referia o estado calamitoso do Sistema Judicial, a dada altura digo meditadamente: "O Sistema Judicial, por razões diversas e inquietantes, é o cancro que está a destruir a Democracia tendencial em que vivemos".
Sabe-se o ponto a que se chegou.
Não podemos deixar que este estado de coisas continue!"
Do estado a que o PS chegou
02 junho 2011
Nem de propósito
Maçonaria e revolução
Existem dificuldades metodológicas intransponíveis na convicção de que a Maçonaria foi determinante numa conspiração revolucionária na França de 1789. A primeira é óbvia: não houve uma mas, pelo menos, quatro Revoluções Francesas, entre 89 e 99, e cada uma das que se ia seguindo devorou apressada e violentamente a anterior. A primeira dessas revoluções foi aristocrática e constitucional, por um lado partidária do Duque de Órleans (Grão-Mestre do Grande Oriente de França, bem sei e já lá iremos...), por outro simplesmente defensora de um sistema de monarquia constitucional com Luís XVI, segundo o modelo inglês, ou, preservando a monarquia, seguindo os passos do constitucionalismo liberal norte-americano. Nesse período pontificam homens como La Fayette, Mirebeau, Barnave, entre outros. Alguns eram maçons, como terá sido o caso do primeiro e do segundo, outros, como Barnave, sobre quem recaiu também essa suspeita, estão hoje, como eles, ilibados pela maioria dos historiadores, visto o seu nome não constar de nenhum quadro das lojas onde foi referenciado (sobre Barnave vd. Albert Soboul, La Franc-Maçonnerie et la Rèvolution Française, Annales Historiques de la Rèvolution Française, 1969, nº 3). Em todo o caso, na Assembleia Constituinte saída do Jogo da Péla, calcula-se que perto de 200 deputados seriam maçons, num total de cerca de 1177. Iso não significa, todavia, que esses deputados estivessem irmanados de um qualquer plano revolucionário-maçónico, de que tivessem sido incumbidos por um qualquer directório secreto. Os tempos eram de excessivo fervor para tamanha contenção.
A segunda revolução – a Revolução Girondina – foi burguesa, defensora dos direitos de propriedade, monárquica e constitucionalista, por convicção, e parcialmente regicida, por necessidade, ainda que só a Convenção tenha decidido sobre o destino de Luís XVI. Dos deputados da Assembleia Legislativa deste tempo, calcula-se que mais de 200 fossem maçons, num total de 745. Muitos dos chefes girondinos eram igualmente maçons, como Brissot, segundo se crê, membro da loja Les Neuf Soeurs, também frequentada por Danton e Desmoulins, cuja acção foi, todavia, determinante em levá-lo, a Brissot e ao directório girondino, ao cadafalso... A terceira revolução, jacobina, teve também protagonistas maçons, entre eles, segundo se acredita, os seus chefes principais, Georges-Jacques Danton e Maximilien Robespierre. Ainda que este último não fosse devoto obediente da Ordem, frequentara em Arras, na juventude, a loja Hesdin, enquanto Danton e outros, como Desmoulins e Hérbert, sejam tidos como obreiros da célebre loja de Paris Les Neuf Soeurs. Isso não logrou, todavia, que a célebre «harmonia maçónica» reinasse entre eles, ao ponto dos três últimos – Hérbert, Desmoulins e Danton, terem visto as suas vidas findarem na guilhotina, por acção do primeiro. E o mesmo sucedeu no ciclo seguinte da Revolução Thermidoriana, na qual padeceram, por sua vez, os maçons Robespierre e Couthon, entre outros também, às mãos de maçons, alguns deles que, tal como eles, pertenciam até ao Comité de Salvação Publica, como, segundo parece, Collot d’Herbois e o próprio Barras.
Não obstante a polémica sobre a filiação maçónica de muitos destes homens (há quem afirme que não existem provas seguras da ligação à Maçonaria de nomes como o próprio Mirebeau e até mesmo de Danton), a verdade é que essa é uma questão desnecessária para se poder avaliar a importância da Ordem Maçónica nos momentos determinantes da Revolução. Na verdade, a tese favorável mais radical inclina-se para afirmar que a Revolução foi obra da Maçonaria e que se desenrolou consoante os seus planos. Ora, isso é desmentido pela evidência dos factos e pela lógica das coisas. Primeiro, não houve «uma» revolução, mas uma sequência de golpes e contra-golpes que levaram à sucessão e destituição de diferentes grupos políticos no poder, assim como à instauração de regimes políticos também eles desiguais nos valores estruturantes. Por conseguinte, nada disto era planificável e foi andando ao sabor dos acontecimentos e dos protagonismos individuais e de pequenos grupos dirigentes, e a factos muitas vezes comprovadamente acidentais. Segundo, porque se alguma coisa caracteriza os dez anos da Revolução foi o facto dela ter, como dizia premonitoriamente Vergniaud, «como Saturno, devorado os seus filhos», ou, utilizando linguagem maçónica, devorado muitos dos seus irmãos. Por outras palavras, não se vê possível um complot maçónico (ou outro qualquer) que traçasse um plano tão caótico quanto o foi a sucessão de acontecimentos da Revolução Francesa, nem se imagina que os homens que eventualmente o tivessem gizado semelhante tragédia quisessem ser suas vítimas pela sua própria morte e pela morte de muitos dos seus amigos. Não é, pois, razoável imaginar que os acontecimentos da Revolução Francesa fossem susceptíveis de um plano pré-concebido, menos ainda que tivesse sido imaginada e executada por quem quer que fosse, menos ainda pelas suas sucessivas vítimas.
Ainda que a maior parte dos historiadores do tempo e da primeira parte do século XVIII (entre eles Michelet e Blanc) quase a não refiram elhe não dêm relevo, a tese da influência maçónica na Revolução é práticamente contemporãnea dos primeiros acontecimentos revolucionários, e é devida ao Abade Lefranc, um dos mais de 180 padres assassinados nos massacres de Setembro de 92, que, nesse mesmo ano, publicou um livro extenso intitulado Conjuration contre la religion catholique et les souverains, dont le projet conçut en France doit s’exécuter dans l’Univers entier, no qual defendeu a tese de que fora a Maçonaria a autora da Revolução. Lefranc foi seguido na literatura anti-maçónica e anti-revolucionária pelo célebre Abade Augusto Barruel, que, em 1798, publicou o seu não menos célebre livro Mémoires pour servir à la histoire du jacobinisme. Estas obras ajudaram a criar a ideia da existência de uma conspiração vinda de fora da França contra a França e as monarquias europeias, que originou a Revolução, da qual seria responsável a Franco-Maçonaria francesa, enquanto mero tentáculo espúrio da «sinistra» Ordem dos Iluminados da Baviera, os célebres Illuminati que ainda hoje enchem páginas imensas da literatura «histórica» fantasiosa, como são o caso dos folhetins de David Brown (sobre as teorias históricas conspirativas, entre elas as que envolvem a Revolução Francesa e a Maçonaria, os Illuminati e os Templários, vd. a interessante obra de Nicholas Hagger, The Secret History of the West, 2005).
É evidente que, quanto mais não fosse, o facto destas obras contemporâneas da Revolução a envolverem com a Maçonaria, obriga-nos a não ser ingénuos e a perceber que a Maçonaria não terá sido um elemento absolutamente neutro no curso dos acontecimentos, embora isso não faça dela, como acima já adiantámos, um agente particularmente activo da Revolução. Vejamos, então, se estes dois aspectos são ou não conciliáveis entre si.
Comecemos pela constatação de uma evidência: a Maçonaria tinha, muito antes dos primeiros acontecimentos da Revolução, uma expressão forte na sociedade francesa, principalmente nos centros urbanos, como Paris, onde a Revolução verdadeiramente eclodiu. As primeiras lojas em solo francês (não necessariamente «francesas», como veremos já em seguida) surgiram logo após 1717 e á fundação, nesse ano ocorrida, da Grande Loja de Londres, a casa-mãe da chamada moderna Maçonaria Especulativa ou Filosófica, em contrapartida à Maçonaria Operativa dos artesãos e construtores de templos e catedrais vinda do final da Idade Média e do período do Renascimento. Em 1735 eram inúmeras as lojas de origem inglesa (e também escocesa) sediadas em França, ao ponto de, contrariando as intenções hegemónicas dos ingleses, ter sido proclamada a necessidade de nomeação de um Grão-Mestre próprio para França. A 24 de Junho de 1738, reunidos numa assembleia geral de maçons, foi instituído o cargo de Grãp-Mestre Geral e Perpétuo dos Maçons do Reino de França, cargo confiado ao Duque d’Antin, e foi criada a Grande Loja de França (a denominação formal é, contudo, apenas de 1765). Em 1743, em virtude da morte do primeiro Grão-Mestre, é nomeado para o cargo o Irmão Conde de Clermont, um Bourbon e aristocrata, primo de Luís XVI, ao qual se sucede, em 1772, o Irmão Duque de Chartes, mais tarde, Duque d’Orléans, no cargo agora designado de Sereníssimo Grão-Mestre da Ordem de França, Ordem essa designada, desde esse ano, por Grande Oriente de França. O novo Grão-Mestre, que atravessou os acontecimentos de 89, ficou célebre, mais tarde, com o epíteto de Philippe-Egalité...
Antes de entrarmos na suposta «conspiração orléanista» a que Philippe deu azo, segundo a qual uma conjura maçónica-revolucionária teria por fim pôr no trono esse primo de Luís XVI (o que, mantendo-se a tese conspirativa, desvia, contudo, o seu foco da conspiração jacobina e republicana), uma nota somente para dizer que, antes do começo da Revolução e até ao surto da emigração aristocrática, a Maçonaria francesa era sobretudo composta pela aristocracia citadina e pela alta burguesia, à qual se juntava um número expressivo de padres católicos (sobre a presença de padres católicos na Maçonaria do tempo da Revolução, vd. o interessante trabalho de doutoramento de José A. Ferrer Benimeli, Arquivos Secretos do Vaticano e a Maçonaria: História de uma Condenação Pontifícia, 1976). A Maçonaria francesa não era, por conseguinte e pela natureza de quem a compunha, um antro de conspiradores que quisessem destruir a nobreza francesa, o clero e, muito menos ainda, implantar a República. Sobre os sentimentos republicanos dos primeiros revolucionarios franceses, vale a pena recordar que Desmoulins disse, pouco antes de morrer, que em 1789, na Tomada da Bastilha, os republicanos não seriam, em França, mais do que meia-dúzia (o próprio Robespierre só se confessa republicano pouco antes da queda do Rei e, mesmo assim, com grandes cautelas e hesitações). Ou seja, a deriva republicana de 92, 93 e 94 não estava manifestamente no espírito dos revolucionários de 89, menos ainda dos maçons dessa altura. A Maçonaria era, assim, nesses tempos primevos da Revolução, um ponto de convergência entre a nobreza e a alta burguesia e o clero, na qual se debatiam, sem dúvida, as «novas ideias», sobretudo as que eram veículadas pelos Enciclopedistas, mas não propriamente onde se preparasse uma conspiração com a finalidade de retirar do vértice do poder político e social as pessoas e as ordens sociais que efectivamente a compunham. Alguns exemplos para melhor ilustrar o que aqui fica dito: a Loja Les Amis Réunis, fundada em 1786, era composta, no seu período aúreo, por 68 obreiros, dos quais 3 padres, 22 burgueses e os restantes aristocratas; a La Nouvelle Union contava com 70 membros, dos quais 19 nobres, 8 padres e os demais pertencentes à burguesia próspera de Paris. Os exemplos poderiam multiplicar-se, mas há um facto inquestionável: dos sans-culottes, a verdadeira «vanguarda revolucionária», não encontramos o mais ténue vestígio nos quadros dos obreiros das lojas. Em contrapartida, muitos dos membros proeminentes da Maçonaria francesa emigram ainda antes de 92 (alguns, por sinal membros proeminente, logo em 89), outros são presos ou mortos (veja-se o caso da célebre Princesa Laballe, amiga privilegiada de Maria Antonieta – também ela tida, por alguns historiadores, como membro da maçonaria feminina -, que foi morta nos massacres de Setembro, do mesmo modo que o padre Lefranc, e que chegou a ser Venerável da loja «Le Contrat Social»), sendo que a maioria das lojas abate colunas em 91 e em 92, após o 10 de Agosto, o que denota o seu claro afastamento dos caminhos republicanos e regicidas seguidos pela Revolução.
Tratemos, então agora, do caso particular de Philippe-Egalité, Grão-Mestre do Grande Oriente de França, indiscutível pretendente ao trono em substituição do seu primo Luís XVI, e a cujas influências se imputam muitos dos primeiros acontecimentos revolucionários. Parece hoje inquestionável que, apoiado por homens como Mirebeau e Choderlos de Laclos e, até - há quem o sustente - pelo próprio Danton, o Duque de Orléans conspirou contra o seu primo e gastou nessa actuação uma verdadeira fortuna, ele que era o segundo maior proprietário do reino, imediatamente a seguir a Luis XVI. Estas eram, pelo menos, as suspeitas de Luís XVI e, sobretudo, de Maria Antonieta, que votava a Philipe uma desconsideração muito particular, embora hoje se acredite que a sua participação no fomento do fervor revolucionário não teve a dimensão, pelo menos nas ruas de Paris, que alguma historiografia lhe concedeu. É certo que ele foi, como já vimos, Grão-Mestre do GOF, mas parece também que a sua proximidade à Maçonaria era mais honorífica e formal do que material. O verdadeiro administrador-geral do Grande Oriente foi, por esses tempos e até 1789, quando emigrou para Inglaterra na sequência dos primeiros acontecimentos revolucionários (e, nesse mesmo ano, para Lisboa, onde veio a morrer), o émigré Sigismond de Montemorency-Luxembourg, adversário declarado do Duque d´Orléans e fiel partidário da Monarquia (na melhor das hipóteses, Constitucional...), que queria ver protagonizada por Luís XVI e não pelo seu duvidoso primo. Deste modo, poderemos concluir que os acontecimentos que levam até 1789 ultrapassam qualquer conspiração da Maçonaria, ou de uma loja maçônica, que pudesse ter sido concebida em favor das pretensões de Orléans. Esta, a ter existido, muito rapidamente perdeu fôlego e foi ultrapassada, pouco tempo depois de 14 de Julho, pela radicalização popular e sans-coulotte do processo revolucionário. Após a queda do Rei e o fim da Monarquia a 10 de Agosto de 92, o pobre Duque tornou-se uma figura verdadeiramente patética e transformou-se no absurdo Citoyen Égalité, ele que ainda no começo desse ano tentara uma reconciliação com Luís XVI, apenas frustrada pela intransigência, mais do que justificada, diga-se, do Rei. Caído em desgraça, foi preso a 6 de Abril de 1793, ainda pelo regime do Primeiro Terror. Em estado de desespero, o pobre homem tentou mesmo desmarcar-se do seu passado maçônico (o que demonstra bem que essa não era uma qualidade apreciada pela nova República), demitiu-se do cargo de Grão-Mestre a 5 de Janeiro de 93, e publicou uma deplorável carta de contrição no Jornal de Paris, a 22 de Fevereiro seguinte, pedindo desculpa por ter sido maçon nestes termos: «Não conhecendo a maneira pela qual se compõe o Grande Oriente e não devendo haver, na minha opinião, nenhum mistério e nenhuma assembléia secreta numa República, sobretudo no princípio do seu estabelecimento, já não quero envolver-me em coisa nenhuma do Grande Oriente, nem saber das assembleias de franco-maçons». O acto foi-lhe de nenhuma utilidade, já que a lâmina da guilhotina lhe trataria competentemente do pescoço a 6 de Novembro de 93.
Parecendo, assim, evidente, que a Maçonaria, enquanto organização, não participou num «plano» para realizar a Revolução Francesa, plano esse por si mesmo impossível de gizar, fica então pendente a possibilidade de ela ter sido, através das lojas, o veículo de divulgação das idéias revolucionárias, sobretudo do pensamento dos Philosophes. Se parece pacífico que Diderot, Rousseau e o próprio Condorcet (que teve um triste fim, como é sabido, nas prisões do Terror) foram maçons, e se as lojas terão servido para, por um lado, promover a aproximação social e até política da nobreza dominante e da burguesia ascendente, e, por outro lado, para que estas pessoas partilhassem, entre si, de uma considerável liberdade de expressão e de opinião no espaço maçónico, que lhes era socialmente muito mais reduzida antes de 89, a verdade é que muitos dos elementos tipológicos da idiossincrasia filosófica de alguma Maçonaria posterior, concretamente da francesa, não a influenciavam nesse tempo e foram adquiridos muito depois. Referimo-nos, muito concretamente, ao anti-clericalismo, ao republicanismo e até ao princípio da laicidade. Antes e imediatamente após o começo da Revolução, a Maçonaria francesa era monárquica, parte dela aceitava os valores estruturantes do Ancien Régime, embora a maioria fosse adepta do reformismo constitucional. Esta era a influência vinda de Inglaterra, mas, sobretudo, dos Estados Unidos, país inequivocamente fundado por maçons, que Lafayette trouxera e fizera plasmar no texto da primeira Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão, aprovada em 2 de Outubro de 1789 pela Assembleia Nacional. E que valores são esses? São os da liberdade e da igualdade civil, do primado da lei, da propriedade, da necessidade da contenção do poder soberano, da Constituição, da separação de poderes, etc.. São ideias que, em bom rigor, provêm, em parte, do Iluminismo inglês e escocês, mais até do que do Iluminismo francês patente nas obras de Rousseau. Não por acaso, a defesa da ditadura de Robespierre – um fanático admirador de Jean-Jacques, haveria de fazer-se para além, ou mesmo contra estes valores e contra esta Declaração e a Constituição de 91, que é sua legítima filha. Por outro lado, os valores que, mais tarde, marcariam parte da Maçonaria de França, entre eles o anti-clericalismo e o jacobinismo republicano, não podem atribuir-se ao pensamento maçônico do tempo da Revolução. Voltaire, o grande filósofo anti-clerical, seria feito maçon a 7 de Março de 1778, menos de três meses antes de morrer, a 30 de Maio desse ano. Voltaire, anti-clerical e anti-católico toda a sua vida, terá querido morrer católico (segundo Carlos Valverde, que exibiu o número de Abril de 1778 da revista francesa Correspondence Littéraire Philosophique et Critique, onde está publicada uma declaração do filósofo anunciando a sua conversão e a sua confissão a um padre católico, o Padre M. Gautier), pelo que não terá procurado a Maçonaria para a tentar influenciar com um anti-clericalismo que já não possuía, como alguns autores defendem, obviamente sem qualquer sustentação. Não é igualmente correcto atribuir-se a Constituição Civil do Clero a qualquer influência maçônica, já que essa intromissão da política na Igreja de França se pode inscrever mais nos conflitos seculares entre os Estados católicos e a Igreja, de que a História de França é rica (vejam-se, por exemplo, os Papados de Avinhão e os conluios que a política internacional estabeleceu em torno do Grande Cisma), como foi rica a História de Portugal, com as inúmeras excomunhões de reis portugueses, com o Beneplácito Régio de Pedro I, para além das muitas Concórdias e Concordatas celebradas entre as autoridades políticas do Estado Português e a Igreja Católica, com o fim de pôr termo ou de evitar conflitos recíprocos. Para além disto, o ateísmo que marca hoje alguma Maçonaria Francesa era claramente rejeitada pelos maçons de então, até mesmo por Maximillien Robespierre, que tinha profundas convicções religiosas, e que atacou os herbertistas também pelo facto deles se declararem ateus (é célebre a fúria de Robespierre pela colocação de alguns cemitérios da frase «A morte é o sono eterno» devida a jacobinos partidários de Hérbert).
A questão da República também não era pertinente na Maçonaria pré e imediatamente pós-revolucionária. A Maçonaria, quando a República se implantou, praticamente desapareceu e, antes dela, era praticamente defensora da Monarquia Constitucional e avessa a uma via revolucionária que rompesse com os princípios originários da primeira Revolução. No Verão de 93 existiam em Paris 4 ou 5 lojas. No ano seguinte, o principal sustentáculo do que restara do Grande Oriente e que era seu administrador-geral, o banqueiro Tassin, foi condenado à morte e executado em Maio. O Grande Oriente desapareceu e ressuscitou, coxo e débil, com Napoleão, que fez dele um instrumento do seu poder pessoal, até 1815. Os valores republicanos que hoje o GOF reivindica, e que não fazem necessariamente parte do patrimônio de outras Obediências francesas, como as actuais Grande Loja Nacional Francesa e Grande Loja de França, acabaram por ser incorporados mais tarde, juntamente com o anti-clericalismo, e seriam pano de fundo da maioria dos movimentos e das revoluções republicanas européias e sul-americanas, do final do século XIX e do começo do seguinte. Destas e de outras questões dogmáticas, como a crença em Deus como o Grande Arquitecto do Universo, viria a ocorrer o cisma maçônico de 1877 entre a chamada Maçonaria Regular, de influência inglesa e sob a tutela da UGLE (United Grand Lodge of England) e a chamada Maçonaria Irregular, ou tradicional, nos países onde, como em Portugal, tem profundas raízes históricas, e que orbita em torno da tradição francesa do GOF. Esse cisma, que continua, hoje ainda, a dividir as Maçonarias do mundo inteiro, foi sendo gerado com o tempo, e de modo algum se pode dizer que, nos seus elementos dogmáticos, estivesse sequer latente durante a Revolução. Diga-se, assim, que neste como noutros temas que hoje a marcam, a Maçonaria francesa é mais filha do que mãe da Revolução iniciada em 1789 e declarada como finda em 1799, por Napoleão Bonaparte.