19 abril 2010

Da realidade do poder (1)


Anos atrás, passei uma semana de férias em S. Miguel, durante a segunda quinzena de Agosto. Fui daqui com a informação meteorológica do costume, o anticiclone e tal, períodos de chuva e por aí fora. Quando lá cheguei, o céu estava limpo; água, só a do mar e a das lagoas que, do avião, me parecia distinguir ao longe. Na viagem até ao hotel, dei conta ao motorista do táxi da sorte que, pelos vistos, tivera logo no primeiro dia. O comentário, em tom sarcástico, às minhas palavras, foi imediato: “Ah! Lá no continente, aqui está sempre a chover…”. E, durante a semana, apesar das previsões do Instituto de Meteorologia, que insistiam em que chovera e choveria abundantemente no arquipélago, só dei por dois aguaceiros (bastante fortes, valha a verdade). Passeei por uma ilha magnífica com um tempo delicioso.
Lembrei-me deste episódio anteontem, enquanto esperava a minha vez numa repartição pública, ouvindo alguém falar ao meu lado sobre o que se passara consigo e a sua família, no decorrer de uma deslocação à Jamaica.
Em primeiro lugar, não puderam sair do hotel durante três dias, devido à realização de eleições. Porque era perigoso, disseram aos turistas; se o fizessem, não se responsabilizariam pela sua segurança. Finalmente, no quarto dia foram autorizados a passear, mas na condição de não usarem vestuário verde ou cor-de-laranja, para evitarem incidentes com quaisquer ânimos ainda exaltados.
Uma noite, após terem passado durante o dia por algumas praias e visitado a terra natal de Bob Marley, ao regressarem ao quarto onde, a conselho dos guias, haviam deixado os telemóveis, verificaram, espantados, que estes registavam trinta chamadas não atendidas, feitas por familiares, em Portugal. Ligaram-lhes, apreensivos com o que poderia ter estar na origem de um tal frenesi. Entre lágrimas e expressões de alívio, disseram-lhes as pobres criaturas que nos noticiários dos canais de televisão portugueses passavam notícias aterradoras sobre um furacão que devastara tudo por onde passara, Jamaica incluída, acompanhadas das respectivas imagens de devastação e tragédia, pelo que tentaram saber se algo de grave os teria eventualmente atingido. Incrédulos, os nossos turistas (choviam telefonemas para os portugueses) deram-lhes conta de que nenhum furacão passara pela ilha, e que aquele a que se referiam se dirigira para norte, em direcção a Cuba, mas que acabara por não causar estragos. Quanto às imagens, bem… talvez tivessem ido buscá-las à RTP Memória.

(continua)

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