05 maio 2007

Ainda a Câmara de Lisboa


Ao contrário de Vasco Pulido Valente, penso que a imagem de Carmona Rodrigues sai reforçada de todo esta triste situação na Câmara Municipal de Lisboa. E que, por suspeição ou constatação, a da classe política ligada quer à direita quer à esquerda, sofre novo e alarmante golpe junto da opinião pública, nela incluída a dos funcionários que ontem se manifestaram. Sob esse aspecto, o artigo de opinião de José Pacheco Pereira, no PÚBLICO de hoje, é de uma lucidez exemplar, a que se junta um travo subjacente inequívoco de amargura e de desilusão.

"Depois da fome e da guerra/ da prisão e da tortura/ vi abrir-se a minha terra/ como um cravo de ternura!": o poema que Ary dos Santos, utilizando a palavra de ordem da esquerda chilena massacrada meses antes ("O povo unido jamais será vencido!"), começa com um equívoco. É que se a guerra tinha acabado, o mesmo não podia dizer-se ainda da fome - e, em certa medida, nem hoje. Com igual gravidade, podemos também hoje constatar que se acreditou que, com a abolição do partido único, adviria a participação política espontânea de todos os cidadãos, associados em partidos que exprimiriam o resultado da livre discussão, isto é, que a liberdade se consubstanciaria na construção de instituições e máquinas partidárias. E nem os cidadãos se empenharam na medida necessária, nem os partidos fizeram muito mais do que transformarem-se em maiores ou menores Uniões Nacionais, negociando entre si ao sabor das conveniências que a entrada para a União Europeia veio trazer. As condições alteraram-se, as mentalidades, pouco; e o que vemos na Câmara nada mais é do que o espelho de tudo isto.


Por este motivo, esqueceu-se (e houve desde o início quem ajudasse a fazer esquecê-lo, a menosprezá-lo ou a dificultá-lo e a colocar-lhe entraves) a participação dos "independentes", isto é, dos cidadãos discordantes ou não directamente dependentes dessas estruturas, pedra de toque de uma verdadeira democracia. É que o independente pode tornar-se para eles num empecilho ou num "empata". A postura do presidente da Câmara de Lisboa, descontando todos os erros que possa ter cometido durante o ano e meio que leva de mandato e aqueles em que incorreu nestes últimos dias, não é a de um político "à portuguesa", é essa exactamente: a de um "empata". E por isso mesmo é que ao cidadão comum, farto da corrupção e da intriga política que diariamente lhe dói no bolso e na paciência com que leva o existir, interessa, contrariamente ao que diz Pulido Valente, a subtileza da distinção entre arguido e acusado. O mais provável é que sejam "esses malandros" que estão a tornar "o gajo, que até é simpático e parece que é competente" no bode expiatório" das sempres entrevistas "negociatas". E seria (será?) muito interessante, aliás, ver a votação dos lisboetas, se Carmona Rodrigues se candidatasse à margem de qualquer partido.


Penso ter esboçado o suficiente acerca do meu ponto de vista, nestas linhas escritas à pressa. Tenciono voltar a ele brevemente, com maior detalhe e aprofundamento.

1 comentário:

RioDoiro disse...

http://range-o-dente.blogspot.com/2007/05/das-misses-mais-fiveis-h-quem-dica.html