Deixou de fumar, começou a fazer jogging, agora corre a meia maratona. A saúde conta. Não é autoritário, nem reservado, nem austero, nem arrogante, é firme. A firmeza vem da vontade, a vontade vem da convicção. É um português que serve. Gosta mais, de resto, de servir o país nos momentos difíceis do que nos momentos fáceis. Não fala, santamente, de sacrifício. Fala, santamente, de missão. É fiel à sua missão e não pretende outra recompensa. Sofre por vir nos jornais; como o outro, não gosta de "ser falado". Viveu sempre dividido entre a acção e "a contemplação e o pensamento". Há, dentro dele, um "permanente paradoxo". A política, no fundo, não passou de "uma soma de casualidades". Mas dará sempre "o melhor de si". Quem não ficará extasiado com este exemplo?
Um homem de família, um homem simples, que tenta ver os filhos: disciplinadamente. Um homem tolerante. Ouve as críticas. Respeita a opinião alheia e espera que respeitem a dele. Quando não está de acordo, não está: e não esquece que foi escolhido pela maioria do povo para "cumprir" o "melhor" para esse povo. "Muito obsessivo com o trabalho", não se considera um workaholic. Tem pena de não ler, por falta de tempo. No Verão, lê "obsessivamente", impelido talvez pelo seu lado contemplativo e de pensamento. Este Verão, leu três livros, dois livros de história e um romance. Admira Ortega y Gasset, "um bom filósofo", que "escreve bem". Quanto a poetas, não admira nenhuma personalidade viva, com a presumível excepção de Manuel Alegre, de que retira um indescrito "prazer".
Acredita que nada impede Portugal de se tornar um "país moderno, competitivo, com uma boa educação e com protecção social". Quer um Portugal "aberto e dinâmico". Acha Portugal "muito aberto". Reafirma que é de esquerda, como provam a Lei do Aborto e as leis da paridade e da procriação medicamente assistida. Pensa que a perspectiva socialista é a de "pôr o Estado ao serviço dos mais pobres". Sabe que ainda existem bolsas de pobreza. Insiste em que os países que controlam o défice são mais livres. Mais democráticos.
Isto o que é? Não é uma pessoa, não é um político, não é um ente reconhecivelmente humano. É uma montagem publicitária: polida, vácua, inócua. O herói de plástico, uma invenção. É José Sócrates, o primeiro-ministro.
09 dezembro 2007
Vasco Pulido Valente, no PÚBLICO de hoje, a propósito de uma entrevista de Sócrates ao El País
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