30 julho 2008

Do mérito e do susto


O primeiro-ministro fez hoje gala na apresentação do Magalhães, o primeiro computador inteiramente montado em Portugal, com o apoio da Intel, e destinado aos alunos do 1º ciclo do ensino básico. Mais ainda: o computador poderá ser adquirido por somente 50 euros e, em casos que requeiram apoio social escolar, conforme o escalão em que se encontrar, o aluno verá o preço reduzido para 20 euros ou mesmo para custo zero. O Magalhães, tal como o nome indica, destina-se também a dar a volta ao mundo e já existem contratos com a Venezuela, a Líbia e outros países de África.
A iniciativa é, sem dúvida, meritória a diferentes níveis, embora eu não tenha a certeza de que a substituição do papel pelo monitor, por muito "ecológico" que pareça ser a curto prazo, não venha a constituir, daqui a alguns anos, um motivo de mais um desgaste da natureza e de uma qualquer acumulação de resíduos, devidos ao acréscimo de fabrico de material oftalmológico. Isto, é claro, pondo de lado o facto de que os olhos humanos também fazem parte da natureza... A não ser que a próxima luta de alguns grupos ecologistas seja pelo analfabetismo, não estou a ver, aliás, como se resolverá o problema da conciliação entre uma humanidade totalmente alfabetizada (como é o seu direito, de acordo com o que é também o ideário do ecologismo) e o consequente desiquilíbrio que isso inevitavelmente provocará. Só os chineses e os indianos a cultivarem-se todos...! Nem a partilha de livros (a de lentes, então, é que não dá mesmo jeito nenhum...) resolve a coisa. Sem falar das implicações do aumento do consumo de energia eléctrica...
Mas voltando ao anúncio do governo: a medida é o equivalente, portanto, a pôr ao alcance da bolsa média das famílias portuguesas material escolar sofisticado, ao nível dos novos "amanhãs que cantam" que aí vêm (a esquerda, como se vê, deixou um "rasto útil" para todos os partidos políticos). Dessa perspectiva, repito, seria uma óptima decisão, para a qual só poderiam ir elogios. Porém, não nos iludamos: as máquinas não serão capazes de ultrapassar a falta de exigência e a verdadeira catástrofe pedagógica a que se assiste no ensino no país desde há vinte anos e que a actual equipa ministerial têm levado ao grotesco, hipotecando o país por décadas. Antes, exactamente pelas suas potencialidades, a reforçarão!
Mais: se ouvirmos bem o que está no filme de apresentação, veremos que nele se reforça implicitamente a ideia de algo bacocamente sinistro e delirante que esta mesma equipa ministerial associou à consubstanciação da figura de professor-tutor, que implementou ao nível dos ensinos básico e secundário. Ora ouçam e assustem-se, e, se não se assustarem, informem-se devidamente, que vale a pena assustarem-se.

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