01 novembro 2009

Então, vá!


Folheando o PÚBLICO de ontem, pus-me a ler um texto de Eduardo Cintra Torres que me deixou em estado criativo de verdadeira graça. Dispôs-se Cintra Torres, com ele, temerariamente, a arrostar com o provável anátema dos mentores de uma nova moda literária, adoptada por um grupo de letrados portugueses que vozeiam num blog, os quais, em apoio ao que é dito por Pedro Mexia num ou dois de textos seus sobre o assunto, decidiram excluir da respectiva prosa os pontos de exclamação, afirmando que continuará a usá-lo como sempre o tem feito, dada a inquestionável utilidade desse sinal de pontuação.
Não se pense, todavia, confidencia-nos, que ele próprio está isento de manias igualmente questionáveis e susceptíveis de serem postas em causa, exemplificando com a sua natural tendência a excluir liminarmente da vista os romances em cujo título figure um verbo. Algo assaz singular, sem dúvida, mas que é nele irreprimível. E lança-se, em seguida, numa aventura da memória em direcção ao tempo em que vivia com a sua família parental, durante o qual se deu conta dessa sua idiossincrasia, de que só se tornou consciente mais tarde, quando, por influência de Lídia Jorge, leu As Velas Ardem Até ao Fim, de Sandór Márai, Lídia Jorge que, apesar de possuir «uma folha de serviço impecável, apenas com romances sem verbos nos títulos, perdeu as estribeiras» e publicou Combateremos a Sombra. Disparando, depois, para a vastidão das viagens literárias que a existência lhe proporcionou já, registando o exemplo dos inúmeros e consagrados autores, nacionais e estrangeiros, que, no decorrer dos séculos XIX e XX, não caíram nesse pecadilho, desastroso para a aspiração a serem lidos. Camilo, nota, soçobrou somente três vezes, entre dezenas de títulos que publicou, Aquilino, outras tantas. Quanto a Dinis Machado, é certo que, cito uma vez mais, «escreveu O que Diz Molero, mas quando a forma verbal se segue a uma conjunção subordinativa “que” ou “quando” aceita-se melhor». A condenação de Miguel Sousa Tavares é, porém, irremediável, ao escrever «qualquer coisa com David Crockett que dá vontade de deixar morrer a personagem sem mesmo começar a leitura».
Termina Cintra Torres com o seguinte passo, onde é possível escutar subliminarmente uma inflexão e uma ênfase de voz que como que pretendem despertar a nossa atenção para a indesmentível cientificidade das razões que determinam a sua intuitiva aversão: «Que títulos com verbos são próprios de certa literatura não é um preconceito meu. Um título com verbo promete xarope. Consultei na Wikipédia os 145 títulos da espanhola Corín Tellado editados em 1972 e 1973 (sim, em apenas dois anos). Desses, 105 têm um verbo no título (72%). Em Barbara Cartland a percentagem é menor, mas facilmente encontrei dezenas.». E remata: «Contudo, até agora nunca tinha visto um título com dois verbos, ainda por cima com ponto de interrogação. Ia morrendo ao ler o título do novo António Lobo Antunes: Que Cavalos São Aqueles que Fazem Sombra no Mar?. Eu não sei que cavalos, nem nunca saberei.».
Devo confessar que, até chegar a esta última parte, me senti literalmente assaltado pela sensação do jornal PÚBLICO me procurar enganar no que toca à qualidade intelectual daqueles a quem proporciona guarida. Lembrei-me, até, da frase rude proferida por José Mourinho, a propósito do seu colega de profissão Jaime Pacheco: “O cérebro dele só tem um neurónio e, mesmo esse, funciona mal”. Aos poucos, contudo, foi-me cedendo a resistência da mente face à luminosidade singularmente persuasiva do que lera. Mea culpa!, digo agora. É que a genialidade intrínseca ao funcionamento holístico de Eduardo Cintra Torres, através do qual o corpo se sintoniza tão perfeitamente com o acto de desvendar cerebralmente os mistérios da estrutura inerente ao real que nos sustenta e no qual nos cumprimos, deslumbrou-me a um ponto tal que somente a poesia poderia exprimir o que sinto agora. Mas quando o génio é pouco e o talento não ajuda, o que fazer? O que fui incapaz, também eu, de reprimir.
Um modesto poema, um singelíssimo poema, de um só verso composto, coincidente, inclusive, com o título, que se me afigurou adequado, no qual, porém, não fui capaz de evitar a inclusão não de duas, mas de quatro formas verbais e mesmo da presença de um ponto de interrogação e outro, de exclamação, associados. Com os meus maiores pedidos de desculpas, pela forma, mas sabendo-o eventualmente desculpável porque eivado de total sinceridade, aqui lho deixo:
Oh, filho! E se fosses c… ao Bilhar Grande, a ver se isso te passa?!

2 comentários:

Anónimo disse...

Joaquim, dou homem por ti, carago!
Afinfa nesses clowns, medíocres e
pugñoteros! Pindéricos lambedores de capas de buques, que só sabem alardear (porra, não disse ladrar,coño!), cuja obra é composta de puemaria chata ou inexistente de todo!
Só pelo lado do sarcasmo vale a pena ligar-lhes meia, a essa gente sem real talento, pegadores de chilras cagadas e que só num país alfacinhista e pedante podem existir!!!!
Aqui lhe deixo estes pontos de exclamação, erectos como um carajón teso frente a eles que lo tienen solo murchito!

Mecago Endioz

ablogando disse...

"País alfacinhista e pedante"... Gostei. Mas que já nem alfaces sabe plantar para seu sustento. E que é pedante porque não sabe ser mais nada.