24 novembro 2010

Este blog tem um só escravo


E quando ele chega à cama, estafado, adormece sem mais conversa.
Amanhã, dizem por aí, será um pouco melhor.
É esperar para ver.
Deixa aqui, entretanto, este poema (delicioso pela subtil ironia) de José Régio.

Em cima da minha mesa
Da minha mesa de estudo
Mesa da minha tristeza -
Em que de noite e de dia
Rasgo as folhas, leio tudo
Destes livros em que estudo,
E me estudo
(Eu já me estudo...)
E me estudo
A mim
Também
Em cima da minha mesa,
Tenho o teu retrato, Mãe!

À cabeceira do leito,
Dentro de um caixilho,
Tenho uma Nossa Senhora
Que venero a toda a hora...
Ai minha Nossa Senhora,
Que se parece contigo,
E que tem ao peito,
Um filho
(O que ainda é mais estranho)
Que se parece comigo,
Num retratinho,
Que Tenho,
De menino pequenino!...
No fundo da minha mala,

Mesmo lá no fundo a um canto,
Não lhes vá tocar alguém,
(Quem as lesse, o que entendia?
Só riria
Do que nos comove a nós...)
Já tenho três maços, Mãe,
Das cartas que tu me escreves
Desde que saí de casa...
Três maços - e nada leves! -
Atados com um retrós...

Se não fora eu ter-te assim,
A toda a hora,
Sempre à beirinha de mim,
(sei agora
Que isto de a gente ser grande
Não é como se nos pinta...)
Mãe!, já teria morrido,
Ou já teria fugido,
Ou já teria bebido
Algum tinteiro de tinta.

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