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Do nosso colaborador Doutor José Jagodes recebemos o seguinte "poema" que passamos a reproduzir.
De acordo com o Dr. Jagodes, que obteve a revelação do mestre universitário Prof.Doutor Pamplinas Miragaia, o nome do signatário é um evidente pseudónimo. Conforme investigações de ponta do ilustre Mestre alfacinha-coimbrão, a versalhada, claramente subversiva da Situação, teria sido produzida por um opositor descarado do governo em exercício, visando quiçá ajudar a "derrubar a gestão do senhor primeiro-ministro", conforme declarou ontem aos jornais, referindo-se ao ambiente geral de euforia, o festejado ministro Vieira da Silva, famoso não só pelas suas semi-barbas de alferes dos tempos de D'Artagnan mas também pela célebre tirada sobre a "espionagem política" a que alegadamente o nosso Alberto João se entregaria em conjunto com cerca de duzentos membros dos serviços secretos nacionais (aliás já reconhecidos no Diário do Governo, de acordo com a SIP e TVY).
Em vista do prestígio do Prof. Pamplinas, fica portanto liminarmente afastada a hipótese de a peça lírica ser dum aliás referenciado revolucionário satânico, já falecido, residente à época no Largo da Esperança nº 2 da conceituada e graciosa cidade de Estremoz, que usava para se disfarçar o nome suposto de Sebastião da Gama. E o panfleto subversivo (poesia, isto? Nááááh...) é assim:
Poesia depois da chuva
Depois da chuva o Sol - a raça.
Oh! a terra molhada iluminada!
E os regos de água atravessando a praça
- luz a fluir, num fluir imperceptível quase.
Canta, contente, um pássaro qualquer.
Logo a seguir, nos ramos nus, esvoaça.
O fundo é branco - cai fresquinha no casario da praça.
Guizos, rodas rodando, vozes claras no ar.
Tão alegre este Sol! Há Deus. (Tivera-O eu negado
antes do Sol, não duvidava agora.)
Ó Tarde virgem, Senhora Aparecida! Ó Tarde igual
às manhãs do princípio!
E tu passaste, flor dos olhos pretos que eu admiro.
Grácil, tão grácil!... Pura imagem da tarde...
Flor levada nas águas, mansamente...
(Fluida a luz, num fluir imperceptível quase...)
Meu país desgraçado!...
E no entanto há sol a cada canto
e não há Mar tão lindo noutro lado.
Nem há Céu mais alegre do que o nosso,
nem pássaros, nem águas...
Meu país desgraçado!..
Por que fatal engano?
Que malévolos crimes
teus direitos de berço violaram?
Meu Povo
de cabeça pendida, mãos caídas,
de olhos sem fé
- busca, dentro de ti, fora de ti, aonde
a causa da miséria se te esconde.
E em nome dos direitos
que te deram a terra, o Sol, o Mar,
fere-a sem dó
com o lume do teu antigo olhar.
Alevanta-te, Povo!
Ah! visses tu, nos olhos das mulheres,
a calada censura
que te reclama filhos mais robustos!
Povo anémico e triste,
meu Pedro Sem sem forças, sem haveres!
- olha a censura muda das mulheres!
Vai-te de novo ao Mar!
Reganha tuas barcas, tuas forças
e o direito de amar e fecundar
as que só por Amor te não desprezam!
in Cabo da Boa Esperança
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