21 janeiro 2011

Penso que fica clara a razão pela qual tantas vezes aqui dou voz a...

Manuel Almeida e Sousa, Nicolau Saião

... Nicolau Saião:

«Disse com justeza e inteligência não sei que Papa recente (creio que foi o grande Albino Luciani, homem de bem e santo homem) ou um outro príncipe da Igreja (não tenho a certeza de qual deles foi, realmente) que a ICAR, por mau entendimento de que se penitenciava, se afastara excessivamente dos artistas contemporâneos, o que levava igualmente a um distanciamento da parte deles.

Creio que é verdade. E não me congratulo com isso. Antes pelo contrário.

Usando frequentemente de intolerância, com sobranceria simoníaca, não percebendo manifestamente que, no artista (ser humano que tem, por sua peculiaridade, de lutar contra os demónios da criação), a iconoclastia e a aparente negação da Fé pode ser o mais alto sinal, nele, de Deus (que decerto não se enfurece pelas suas buscas e resultados alcançados, por vezes mediante um esforço terrível), os burocratas da hierarquia fuzilam com o olhar gente pacífica e cujas obras nada têm de satânico.

Mas a incapacidade de ver de certa gente, e a sua arrogância (que é sinal claro do demo que os manipula) tem dado o bonito resultado que hoje bem conhecemos.

Veja-se o que se passou durante tantos anos com Matisse, tido por ateu relapso e provocador quase até à velhice. E só por causa da inteligência, tolerância e entendimento são dum digno sacerdote, que soube vencer o negrume de alguns antístenes pouco cristãos, a extraordinária Capela de Vence pôde ser iluminada pelo genial pintor (sofria ele já nessa altura de dolorosas artroses, pelo que alguns trechos foram feitos em papel recortado).

É uma obra maravilhosa. Creio que Deus, como artista que é de certezinha, passa de vez em quando por lá, ao visitar este cantinho da galáxia. E um sorriso bom lhe deve perpassar no rosto sagrado.

Quando tinha os meus quarenta anos, tendo ido um dia a Póvoa e Meadas e entrando na igreja de lá, de moderna traça e de amorável feitura e seduzido pela religiosidade que ali se entrosava em nós duma maneira singular (sentia-se, ou senti, se assim o digo, o céu e a terra misturados, irmanados, como o senti também numa floresta do Canadá ou nas planícies ardentes do Calaári, ou até numa vulgar rua ou estância), um desejo se apoderou do meu pensamento: efectuar, ir efectuando pelos tempos - quando me sentisse mais religado - obras com que um dia iluminaria uma capela (dia que evidentemente nunca chegará, pois para a intolerância e a incompreensão (a soberba?) dos Católicos portugueses de topo eu não passo dum ateu (que nunca fui, alguns confrades sabem porquê) dum maldito porque não vou aos templos bater no peito em conjunto com sepulcros caiados.

De modo que, sem qualquer pretensiosismo nem acinte - antes com uma certa mágoa, que os de recto coração a meu ver entenderão -, vocês (se me permitem!) irão ser a minha capela.

Os vossos olhos serão as paredes dessa Capela que nunca os meus traços e as minhas formas poderão iluminar. Em vocês, caros confrades, coloco as minhas pobres obras mortais (estas dezasseis) - mas feitas com toda a comoção de uma pessoa que anda por este Mundo e sempre buscou que fossem de inteira e alegre fruição, pese às mágoas que a todos nos circundam.»




Génesis


O Paraíso terrestre


Adão e Eva


A árvore da Vida


Satan


A expulsão do Paraíso


Moisés


Anunciação


As bodas de Canaã


O sermão da montanha


O Filho do Homem


Páscoa



Crucificação


Os Apóstolos


Evangelhos



E paz na terra aos homens de boa vontade

5 comentários:

Anónimo disse...

Muito belo sem dúvida, mas acho que é ingenuidade pensar que a Igreja pode entender este e outros autores do género, estiolam parados no tempo basta ver, o Papa veio cá e só disse vulgaridades para os habituais fiéis da rotina e dos banhos de multidão. Acho que não há volta a dar-lhe a Igreja já foi.

Anónimo disse...

Eu entendo o meu estimado amigo NS, ele como já lhe disse em privado é sensível aos aspectos poéticos duma religiosidade humanista. O problema é que isso não existe, temos de ver a Igreja histórica, que é feita de oportunismo, falsidade civil e aproveitamento dos ideais da gente simples. Pensares que eles são sensíveis à Arte é utopia. Eles deram emprego ao Miguel Angelo e outros só porque ele era apreciado e mediático como se diz hoje e fazia coisas de que eles se podiam aproveitr para encherem o olho aos cidadãos. Pura utilização propagandística e senão veja-se as filosofias do Ratzinger que são só conversa fiada tendo em conta a realidade que ele pratica.

M. Caldeira, Castelo Brano

Anónimo disse...

Agradeço ao anónimo e ao meu confrade Manuel Caldeira, que me conhece bem pois me fez com o Augusto José uma entrevista onde pude falar à vontade, as suas opiniões.Ainda que me chamem ingénuo.
Acho que nao o sou. A frase do MC talvez vá ao cerne da questão quando diz que eu "sou sensível aos aspectos poéticos duma religiosidade humanista".
No fundo, talvez eu tenha uma noção do sagrado que, devido a uma certa maneira de ser que vem da minha infância onde não tive más experiencias com a religiosidade, tento colar aos membros daquela confissão.Creio que é desculpável esta minha inflexão.
No que diz parte à prática, cerca dos 11/12 anos deixei de ir aos templos como participante, pois o ambiente de hipocrisia, arrivismo e fechamento maldoso que ali notei despertaram-me uma profunda repugnancia. O que não significa que não vá lá sózinho, não para rezar porque isso se faz em qualquer lado, até fazer um poema ou um cozinhado pode ser rezar (sem beatices de controle outer space) mas para sentir um pouco do passado em que ainda não tinha sentido que me/nos enganavam com cinismo.
Tenho conhecido boa gente ligada à Igreja (por exemplo o bispo jubilado D.Augusto César e alguns outros como o poeta Garcia de Castro) mas no que respeita aos praticantes ferrenhos raramente tenho encontrado gente tão dissimulada e até velhaca. Pouca sorte nos contactos? Talvez...
No que respeita à "ideologia" em si mesma, sei o que significa e o que é. Por isso posso dizer: não sou ateu pois sei que significado tem o termo Deus. Mas é algo muito diferente do Deus dos fideístas,das religiões como "estados" que, servindo-se dessa figura enigmática, tentam submeter os outros ao preconceito e ao império das suas ideias feitas. O que tem destroçado o mundo, pois é apenas uma figura de retórica, neles, para impor poder. Com o pretexto de uma tal "salvação", que falhou redondamente e pela qual irão a seu tempo prestar contas.
Mas isso não tem a ver comigo, sou umn mero observador...
ns

Nausícaa, São Paulo, Brasil disse...

Caro Joaquim Simões,

Vendo essas obras de Nicolau Saião transbordantes de pureza e inocência, eu penso nas obras que meus olhos já viram em várias igrejas brasileiras, por exemplo, na Catedral Metropolitana de Brasília, capital do Brasil, em:

http://www.flickr.com/photos/site1click/2917134121/

ou

http://www.do-ar.com/2008/10/04/df/

Se pesa-lhe muito o ressentimento frente a incompreensão de insensíveis sacerdotes paroquianos, dizei vós a ele, andarilho do mundo, a vir cá para o Brasil, no qual suas obras encontrarão destemida acolhida em qualquer nova construção eclesial.

Anónimo disse...

Suscitado por uma sms do nosso caro confrade e amigo Joaquim, vim antes de me ir deitar ver o "Portugal...". Leio com apreço o comentário da cara Nausicaa. E digo: infelizmente já não tenho, por deveres familiares que aliás não me pesam, possibilidade de ir para o Brasil.
Mas pego-lhe na palavra: e ofereço as digitalizações a quem as quiser elaborar como painéis de cerâmica ou copiando para as paredes, usando essas técnicas que os profissionais conhecem, numa capela qualquer, mesmo a mais humilde, pois me merece respeito e consideração esse lugar ainda que desconhecido e hipotético.
(E ainda tenho outras, que não mandei para o espaço do JS para não empanturrar).
Um acto de amor para com o sagrado? Não, apenas um pouco de calor humano dum modesto pintamonos lírico e ainda algo sonhador para com o universo e as pessoas que o povoam.
E cara Nausicaa, não tenho bem ressentimento para com os sacerdotes que o não sabem ser, antes diria que é mágoa pela cegueira deles, não por não amarem eventualmente a minha pintura mas porque amam mal o ser humano e o Grande Mistério, sem desdouro o digo.
Abrqson do ns