Entrevista a Kurt Westergaard, conduzida por Natália Faria, no PÚBLICO de 3 de Outubro.
Vai publicar em Novembro um livro de memórias que replica o cartoon em Maomé surge com uma bomba no turbante pronta a explodir. Não tem medo de novas ameaças?
É um livro sobre a minha vida, que, aliás, não teve nada de muito extraordinário, exceptuando os últimos cinco anos. Quanto às ameaças, uma pessoa habitua-se. E penso que, em relação a isso, tenho uma vantagem: sou um homem velho. Quanto mais velhos, mais corajosos nos tornamos, porque aquilo que arriscamos, diminui. Aos 75 anos, a minha perspectiva de vida é muito limitada.
Estava a pensar no risco de haver mortes de inocentes num cenário de eventual reedição de protestos. Alguns supermercados e livrarias já se recusaram a pôr o livro à venda…
Há esse risco, claro, mas, sabe, não fui eu que iniciei esta confusão, foram os terroristas. Não penso que possa ser responsabilizado por nada disto, porque eu limitei-me a trabalhar de acordo com as tradições do meu país, que entende a liberdade de expressão.
O que é que mudou na Europa nos últimos cinco anos, em questões como a tolerância e a liberdade de expressão?
Penso que a Europa está diferente e iniciou, entretanto, um processo que era necessário e que é o de discutir qual deve ser o papel da religião nas sociedades modernas e seculares como as que vivemos. Se olharmos para isto de um ponto de vista dramático, atravessamos um momento de colisão entre duas culturas; numa óptica mais moderada, podemos falar de fricção entre duas culturas. Não penso que possamos fugir a este confronto, temos é que encará-lo com atenção, diálogo e uma atitude pacífica.
Na sua opinião, onde é que a religião se encaixa nas sociedades modernas?
Na Dinamarca, eu vivo naquilo a que se chama um estado secular, sem religião como elemento de política, e penso que os nossos cidadãos muçulmanos têm forçosamente que aprender a respeitar isso. os muçulmanos chegaram ao nosso país sem nada e nós demos-lhes tudo: casa, dinheiro, educação, e note que a educação na Dinamarca é gratuita e cada estudante recebe do Estado qualquer coisa como dois mil euros por mês. Ou seja, a Dinamarca é um estado social que não aceita que as pessoas sejam pobres ou maltratadas. Portanto, nós tratamos os novos cidadãos muito bem e o que exigimos em troca é respeito pelas nossas normas e tradições.
Mesmo na Dinamarca, o Danks Folkeparti tornou-se na terceira força política do país. Como encara a ascensão da extrema-direita em sociedades ricas como a dinamarquesa, mas também sueca ou holandesa?
Na Dinamarca, temos alguns problemas com os jovens imigrantes muçulmanos, que estão a formar gangues nos subúrbios e a transformar bairros em guetos onde um cidadão vulgar tem medo de entrar. Os muçulmanos têm realmente dificuldade em aceitar os estados secularizados, e isto cria alguma tensão que leva a que o dinamarquês comum viva assustado.
Mas os sinais de intolerância estão por toda a Europa. Estou a pensar na deportação dos ciganos em França.
Os partidos da extrema-direita estão a crescer em toda a Europa, mais uma vez porque as pessoas andam assustadas em toda a parte. Maioritariamente sem razão, porque penso que o nosso sistema - democrático, secular e capitalista - é invencível.
Acha?
Sou tão velho que já experienciei o nazismo, o fascismo, o comunismo e agora este maldito islamismo. Todos estes ismos traduzem fanatismo e, quando se é fanático, vive-se uma vida sem dúvida. Ora, eu penso que a dúvida é o sentimento mais construtivo que nós podemos ter.
A Europa deve fechar as suas portas aos imigrantes?
Sim, ou, pelo menos, tem que ser mais cuidadosa. Claro que há milhões de pessoas que vivem em países em muito más condições, mas a verdade é que não podemos ajudar o mundo todo nem impor a nossa cultura a pessoas que a rejeitam. Por isso digo que fizemos uma coisa muito estúpida, e agimos como imperialistas culturais, quando iniciámos uma intervenção no Afeganistão. Eu acredito que as religiões totalitárias estão condenadas e vão desaparecer, mesmo que leve muitos anos. Até lá, não devemos sacrificar jovens vidas europeias nesta guerra, que é, na verdade, uma guerra contra a cultura muçulmana.
E quanto aos 20 milhões de muçulmanos que vivem dentro das fronteiras europeias?
Devemos tentar fazer tudo o que pudermos para os integrar, mas, para isso, eles têm que respeitar também as nossas normas. Temos que ser pacientes e lembrar que, na Dinamarca, um muçulmano pode estabelecer-se e estabelecer a sua própria escola muçulmana e que o Estado até o apoia nisso, como apoia o direito de toda a gente ter uma religião, desde que essa religião não comporte normas inaceitáveis para a sociedade. Penso que o desafio é transformar o islamismo clássico num islamismo light, que deixe de lado todos os fundamentalismos como os relacionados com a homossexualidade ou com a secundarização do papel da mulher. O problema do Islão é que se transformou numa ideologia política.
2 comentários:
Muito lúcido este homem. É importante que se diga que a religião (chamemos-lhe assim pois de facto é uma ideologia de combate) islâmica, sendo totalitária apesar das maquilhagens "moderadas" (pura estratégia ou não cumprimento por interesse venial do que Maomé manda a todos os seguidores, converter o Outro ou matá-lo se ele não quiser)não contém espaço para discordar. No mundo islâmico não se pode ser não-praticante, muito menos agnóstico e é totalmente proibido ser-se ateu.
Nunca poderá haver espaço para pensar o papel da religião no mundo, é ser-se crente e pronto.
A "discreta" compreensão e o dissimulado apoio moral que o Vaticano tem dado à Fé islâmica deve-se a: 1. O Vaticano ser tendencialmente totalitário, logo émulo do outro sistema. 2. Vivenciar o islamismo como um colega que lhe garante existencia "ad contrarii", assim como os ladrões garantem a existencia da polícia.
Ambas estão fadadas a desaparecer, pois a progressiva qualificação da cultura viva faz dissolver a superstição de que as "religiões" não são mais que um aspecto.
Paulo Burmester
Cito: "O problema do Islão é que se transformou numa ideologia política".
E eu direi, baseado em factos históricos como por exemplo Claudio Vilalba aponta no seu exemplar "O Mundo islâmico na Europa submetida": sempre o foi, o entrevistado claramente não quer forçar a nota com a verdade pura e dura, creio que por espírito de tolerancia.
A páginas 24 do intróito, Vilalba refere:" A doutrina proposta e sustentada por Mahoma é uma refutação e um combate claro contra os deuses das tribos árabes. Ao proporem e finalmente imporem este monoteísmo, as hostes muçules visavam uma congregação que a princípio lhes desse a Arábia, depois essa região oriental, a seguir a Europa e os impérios afastados que, para eles, eram o Mundo tal como se conhecia".
Creio que está tudo bem explícito. O que sucedeu é que, com o avançar do tempo e a abertura dos inconscientes colectivos e, principalmente, dos conscientes, ficou patente que o Islamismo não é uma religião no sentido exacto mas sim uma "ideologia metafísica" com fins pragmáticos.
Ou seja, com o avanço da modernidade já não é possível aos ayhatolas e mullahs disfarçarem.
É esta a explicação para se tentarem cobrir com uma presuntiva "moderação" ou como diz com graça um dos comentadores "islamismo light".
Não há islamismo light assim como não há tigres vegetarianos ou crocodilos voadores, a não ser na anedota russa.
E isto não sucede porque os vulgares crentes sejam maus, muitos são pessoas urbanas e outros pobres diabos sofredores e sim porque tal facto está contido nos seus dogmas e prática real de exigencia.
Paulo Almeida Burmester
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