O governo de salvação nacional ou a falácia narrativa de braço dado com a Lusitânia-cacânia
Lentamente, vai-se desenrolando o processo da apreensão da sociedade portuguesa da particularidade histórica do momento. Como se sabe, apreensão é diferente de compreensão e o importante fosso que as separa pode trasvetir-se de variadas formas. Entre o assustador da primeira fase e o desenvolvimento da acção, há um período, que na Lusitânia oscila entre o muito largo e o infinito, de reflexões metodológicas. As gazetas de maior circulação – sem saber bem porquê, Sextus tem pudor em nomeá-los por jornais – vão propalando a aposta de um importante grupo luso-cacânico na formação de um governo de consenso alargado, que vai da miséria de incluir o partido socialista até ao humor de incluir o partido comunista, chamando-lhe de governo de salvação nacional.
Esta falácia narrativa, só vendável quando se restringe à fase sincrética e animal da apreensão, do governo de salvação nacional não resiste ao menor esforço de análise. Sextus não quer ser injusto em recordar o triste destino dos governos de salvação nacional fora dos tempos de guerra, tal é-o por inerência. Quando se lida com situações ditas de salvação nacional, nunca a história registou a capacidade do grupo que estava no poder, logo determinante da situação que levou à necessidade de salvação, em atingir esse nobre objectivo, o que se passou foi algo mais salvífico, o afastamento mais ou menos cruento desse grupo que clama pela salvação por outro grupo, que até aí nem sequer podia subir à varanda do poder e que não clama por salvação mas age e move-se para a substituição.
A procura da salvação nacional é sempre a tentativa da manutenção restrita de um status quo, Sextus compreende perfeitamente que a susbstituição que se anuncia na governância lusitana nada tem a ver com a substituição do grupo dominante, apenas se trata de diferença de sub-grupo – a decadência do ocidente prossegue o seu curso, mas ainda tem boas décadas de involução á sua frente. O clamor pela salvação nacional é sempre o apelo inseguro do grupo dominante á adesão do maior número de sub-grupos possíveis a um plano de inacção o mais completo que for sustentável.
Sextus não acha que a lusitãnia necessite de salvação nacional, está convicto de que precisa sim de um bom governo. Na realidade, do que se pede à lusitânia é a implementação de um programa de reorientação e diminuição dos recursos postos à discricionaridade da máquina estatal. Os dois principais problemas são a incapacidade de criar emprego e a insustentabilidade das dívidas pública e privada. Para resolver estes problemas é necessário um governo de salvação nacional (GSN)?
Para renunciar ao novo aeroporto e ao TGV é necessário um GSN?
Para parar um tresloucado plano rodoviário nacional é necessario um GSN?
Para reaproveitar a terra é necessário um GSN?
Para aproveitar os recursos marítimos é necessário um GSN?
Para diminuir a carga fiscal progressivamente para níveis adequeados ao nosso desenvolvimento, algo à volta de 25% (em contraponto com os actuais 36%) é necessário um GSN?
Para fazer a contracção dos códigos judiciais, informados por dois princípios, justiça sem tempo é uma caricatura de mau gosto e se a justiça não consegue avançar ao fim de um certo período, termina um processo, reconhecendo humildemente que nem sempre os homens podem administrar justiça, é preciso um GSN?
Para rearranjar o mapa administrativo é preciso um GSN? (Neste campo, para extinguir os governos civis é necessário um GSN?).
Para contrair o grupo de gestores de um hospital de mais de trinta para seis, como o foi durante anos, é necessário um GSN?
Para diminuir o número de vogais de uma EPE é necessário um GSN?
Não é necessário um GSN, é necessário um empenho de uma elite dirigente com capacidade decisional e comunicacional. Obviamente, uns vão ao aderir, outros não, mas não foi sempre assim, não é o género humano pertença do grupo dos primatas e não dos ungulados (saúdo-te delicioso javali)?
Sextus sabe que é pedir muito a esta elite lusitana, que tem tudo de lusitana e quase nada de elite, mas tem esperança numa reflexão de uma ministra das finanças de um governo recente, os portugueses só mudam com o garrote financeiro no pescoço.
O garrote já nos foi colocado; ainda não está claro quantas vão ser as voltas do parafuso.
Nota de fim de semana – torna-se necessário aderir a alguns pressupostos duros: aumentar impostos numa recessão é inevitavelmente seguido do aprofundamento de uma recessão; o que o PSD deve fazer é baixar ordenados e baixar os impostos até onde for suportável, mantendo, dentro do cumprimento dos acordos internacionais, uma taxa maior nos produtos sem incorporação nacional. Apesar disso, não será possível escapar ao drama espanhol: desmprego altíssimo em recessão, desemprego moderado quando em expansão.
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